terça-feira, 19 de junho de 2012

Caminhada


Dizem que o amor na maioria das vezes esbarra em você, te leva ao chão e pode até te machucar com a queda. Dizem que ele faz sofrer, causa confusão e angústia. Assim como a chama devassa que incendeia um canavial de madrugada e se apaga pela manhã, deixando apenas um rastro de destruição, é também o mais abalador dos amores - e o mais curto deles. No entanto, este também pode adquirir a forma sublime da chama que, aparentemente pequena, é abrasadora e permanece longo tempo acesa, servindo ao propósito daquilo que se coloca sobre ela em expectativa, e também levando calor a tudo que está ao redor. Nem sempre o amor mais puro é caótico, às vezes ele é apenas um calor suave que chega a um coração já um pouco cansado em meio aos golpes do mundo, mas nem por isso diminuto em sua capacidade de amar. O amor não afeta um único aspecto da vida, e nem sempre percebemos onde ele está agindo. Ele tem o dom de mudar, mas como uma lagarta que se transforma em borboleta lentamente dentro do casulo: ninguém a vê inicialmente, nessa mudança de dentro para fora. Ainda assim, quando ele nos muda, nos usa e nos abusa, nós nos transformamos em algo parecido com esta bela criatura: tão bela, de rumo incerto, e ao mesmo tempo tão frágil, que não poderia deixar de ser sublime em sua ínfima essência. 
Ainda existem estes estranhos amores nos derrubando e incendiando na estranheza de nossas almas pequenas demais para comportá-los, mas é certo que o amor que permanecerá não é aquele que esbarra em nós, e sim aquele para o qual caminhamos, dia após dia, edificando mais e mais nossos corações, tornando-os aptos a recebê-lo e correspondê-lo. Pois o amor, tão belo, em coração sujo e despreparado, é como a borboleta esplendorosa de mil cores que pousa na flor da qual a vida já se esvaiu e que vai secando com o passar dos dias. 

"É fácil caminhar lado a lado,
difícil é saber como se encontrar!"

Com inspiração em Fernando Pessoa; para Fernando, minha Pessoa.